Após romper com o PSOL, grupo do Maranhão anuncia entrada no PSTU. Leia entrevista
‘Nossa perspectiva é que o PSTU se fortaleça como referência de esquerda no Maranhão’
• No início do ano um grupo de 49 militantes do PSOL, organizados no grupo CAC (Coletivo de Ação Comunista), divulgou um manifesto em que anunciava sua saída do partido. A ruptura se deu após embates entre o grupo e a direção nacional da sigla, que chegou a intervir no estado para impor a filiação de ex-petistas no partido. Nos meses que se seguiram o grupo se aproximou do PSTU e, após uma série de debates, resolveu por se filiar ao partido, processo que se oficializará em um ato público no próximo dia 22.
O Portal do PSTU conversou com Saulo Arcangeli, dirigente do CAC, ex-candidato do PSOL ao governo do Maranhão, que explicou as desavenças com o antigo partido e as bases em que se deram a aproximação e a entrada no PSTU.
Explique como se deu o processo de ruptura do grupo com o PSOL
Saulo Arcangeli Estávamos num grupo de 49 companheiros, pessoas do movimento popular, professores, servidores públicos que realmente construíram o partido e ficamos sete anos verificando que o PSOL passou por um processo de degeneração muito rápido. É um partido que não segue o seu programa, não tem uma estratégia socialista, que buscou nesses anos só via institucional, e que abandonou as lutas. Então foram sete anos de embate e o processo de desgaste foi acelerado por uma intervenção da direção nacional para a imposição da filiação de ex-petistas. Foi um processo em que fizemos uma discussão estadual e que a direção nacional não respeitou, já que a direção estadual, após um processo em que garantiu ampla defesa, votou pela impugnação desses filiados, de acordo com estatuto do partido. Mas a direção nacional resolveu garantir a filiação, passando por cima da direção estadual. Sem nenhum processo de diálogo, sem nenhum critério para a filiação. Então, a gente viu que o processo de degeneração do PSOL acabava de se completar. E achamos a partir daquele momento que não tínhamos mais espaço no partido. Um grupo com o qual dialogávamos nacionalmente também ratificou essa posição da direção nacional e para a gente acho que não tinha mais como nos manter no partido e resolvemos sair coletivamente no partido.
E o que vocês fizeram após a ruptura? Como foi a aproximação com o PSTU?
Os próprios companheiros da direção estadual e da direção nacional do PSTU nos procuraram e nós abrimos o diálogo. Criamos uma coordenação estadual do nosso grupo ao qual pertencíamos com a direção do PSTU, e realizamos dois seminários. Um companheiro da direção da LIT viajou até o Maranhão para fazermos uma discussão sobre a conjuntura internacional, e um companheiro da direção do PSTU discutiu com a gente a questão nacional. Depois continuamos mantendo o processo de unidade nas lutas, e continuamos discutindo, inclusive textos do pré-Congresso do partido. E aí em uma segunda etapa discutimos a questão da organização, concepção de partido, e a partir desse segundo seminário, nos reunimos e deliberamos nossa entrada coletiva no partido como grupo, já que vínhamos discutindo como grupo. E isso abre um processo importante no estado, que são companheiros lutadores importantes no estado do Maranhão que vão entrar no PSTU e algumas outras pessoas que nem eram do partido nem do CAC mas que também se aproximaram, porque viam que eram o único partido de esquerda no estado. Então é um processo contínuo. Vamos ter nosso ato de filiação no próximo dia 22 de setembro, o companheiro Zé Maria vai estar presente. Vamos ter uma plenária conjunta onde concordamos também em aprovar uma direção paritária do partido, nucleando as pessoas.
E quais foram os principais pontos decisivos para a entrada de vocês no PSTU?
No Maranhão nós já tínhamos uma proximidade com o PSTU nas lutas, mesmo quando estávamos no PSOL, principalmente através da CSP-Conlutas. Algumas questões que tínhamos discordância nós fizemos o debate, sabemos que é uma experiência nova, tanto para quem está entrando como para os companheiros que já estavam no PSTU. Mas eu acho que foi um processo de diálogo e debate muito importante, tanto do ponto de vista teórico, ideológico, como de concepção de partido. Tínhamos já muitos acordos, o que facilitou isso, e os seminários também serviram inclusive para melhorar o diálogo.
E como se deu a discussão em termos de organização?
Nós vínhamos de tradições diferentes, alguns do PT, outros do PSOL mesmo, sabemos que o PT e PSOL, como organização, aceitam as tendências e as frações permanentes. Esse foi um ponto que a gente colocou bastante no debate. Também debatemos a importância do centralismo democrático. Nós sabemos que a existência de frações e tendências o tempo todo dentro do partido foi um processo que acabou com o PT e que transformou o PSOL no que é hoje. Vira mais uma disputa de tendência pela hegemonia do partido, que priorizava mais a discussão interna pra ver quais as tendências que tinham mais poder interno e abandonou a luta. Foi importante esse diálogo para ver como funciona o PSTU. Outra questão é o nucleamento. A gente sabe que no PSOL também tinha os núcloes, mas que era algo muito frouxo, não tinha a organicidade que a gente vê no PSTU. É diferente, a pessoa entra e já organicamente tem que participar de um núcleo, é um processo importante de fortalecimento que a gente não tinha realmente no PSOL. Então, as dúvidas foram tiradas, tivemos dois dias de debates profundo sobre isso e as pessoas se convenceram na entrada no partido.
Quando vocês estavam no PSOL, já tinham essa preocupação em relação às tendências, ou foi algo que vocês foram percebendo com a dinâmica desse partido?
Nós tínhamos uma preocupação com as tendências que vieram do PT, sabíamos que poderia ser da mesma forma com o PSOL. Não tínhamos uma visão de que essas correntes iriam transformar o PSOL no que foi transformado. Seria mais um processo de debates, mas acabou acontecendo a mesma coisa. Então foi mais uma experiência para demonstrar a dificuldade de um partido com tendências e frações permanentes. A gente sabe que no PSTU, durante o período congressual há a liberdade de se atuar em tendências, mas que ao final do congresso todos tem que seguir a definição votada pela maioria. Isso não acontecia no PSOL. A presidente do partido, após uma votação do partido, tomava outra decisão. Então, a gente viu que isso não avançou e não fez crescer o PSOL como uma alternativa revolucionária, uma alternativa socialista para esse país.
E por que você acha que isso aconteceu com o PSOL?
Isso aconteceu porque o PSOL veio com os erros cometidos pelo PT e os aprofundou ainda mais. O partido buscou privilegiar a via institucional. Os congressos do PSOL quase que nunca chegavam ao final, tal era a disputa de tendência em quem ia comandar o partido. Abandonou as lutas reais, as lutas sociais, que inclusive está proposto em seus estatutos, em seu programa. Com isso, essa institucionalização, essa burocratização do partido e essa via apenas eleitoral, foram os fatores que acabaram hoje fazendo com que o partido fosse cada vez mais definhando. Com um processo de inchaço, sem qualquer critério para filiação, isso vem ocorrendo em nível nacional.
Qual a importância que você vê na construção de um partido revolucionário, principalmente no Maranhão que é governado por uma oligarquia extremamente reacionária?
O problema lá é que alguns partidos que se dizem de esquerda aproveitam parte dessa oligarquia. Mas é um estado em que se poderia ter um partido realmente de esquerda, com influência de massas. A proposta inclusive do PSTU no Maranhão é fortalecer o partido não só na capital, mas também nos municípios. É uma realidade muito difícil, com uma população extremamente pobre, com os piores indicadores tanto em Educação como em Saúde. É um estado realmente em que não é fácil fazer a luta, vivemos uma realidade em que o capital está vindo com muita força, chegando para expulsar os trabalhadores. Algumas empresas estão chegando, como as de Eike Batista que vem explorar o petróleo, o gás, minérios, e com isso tenta expulsar os trabalhadores das terras, as comunidades quilombolas, os indígenas, ribeirinhos. O agronegócio também está vindo com muita força. Em algumas regiões só há eucaliptos, a Suzano chegou e pegou grande área do estado para plantar eucaliptos. A especulação imobiliária também está expulsando o pessoal da área urbana. Então hoje temos várias lutas e é importantíssima a intervenção de um partido político que esteja inserido nessas lutas. Não que vá interferir na linha do movimento, mas que é importante se inserir inclusive para dirigir nesses momentos de embate contra o capital.
Um processo de fusão como esse ocorre não só por acordos políticos e estratégicos, mas também através de uma relação de confiança entre os militantes, como isso ocorreu?
Exatamente. Foi um processo bem transparente, nos debates colocamos posições inclusive divergentes. Esses momentos serviram para mostrar a sinceridade nos debates, todos colocaram sua posição e todos amadureceram muito politicamente. Esse processo foi muito importante inclusive para a decisão da entrada no PSTU. No início nem todos queriam militar nesse momento em outro partido, mas foi o amadurecimento do debate que convenceu esses companheiros. E abre um processo importante de discussão com alguns companheiros que podem entrar futuramente.
Qual é a sua expectativa no PSTU?
Temos uma expectativa muito boa, sabemos que nesse primeiro momento vamos estar vivenciando e conhecendo o partido. É uma etapa importante, que a gente precisa manter sempre o diálogo. E a nossa perspectiva é que o partido cresça, se torne uma referência importante de esquerda no Estado, já é inclusive uma referência, mas que se fortaleça, porque hoje no Maranhão só temos o PSTU como partido de esquerda. O PSOL passa por esse processo cada vez mais de direitização e o único partido que pode cumprir esse papel de esquerda no estado realmente é o PSTU, porque precisamos de um enfrentamento muito grande com o capital lá.
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